quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Capa da Revista Veja sobre atentados em Paris e a liberdade de expressão

Muito interessante a capa da última edição da revista Veja.

Não vou aqui debater o conteúdo da Revista que é lida por muitos e detestada por outros tantos, ainda que cumpra um papel relevante no quesito investigativo.

Voltando à capa, pode-se perceber a representação de um fuzil desenhado com borracha, lápis, um esquadro, etc. Enfim, materiais de escritório, materiais de desenho. A frase que comenta a ilustração diz: “Às armas, cidadãos!”

Edição 2408 de 9 de janeiro de 2015
A que arma estava se referindo? Àquela de papel, caneta, borracha, esquadro...

Os atentados em Paris chocaram o mundo e retrataram tanto o ódio muçulmano quanto o despreparo para conter esse tipo de violência. Apesar de vários outros atentados terroristas no mundo, inclusive mais sangrentos, este foi o último mais comentado. A discussão gira em torno da liberdade de expressão. Será que existe limites para a liberdade de expressão? Alguns pensam que sim, outros não.

Mas o que ocorre quando o uso da própria liberdade de expressão possibilita a perda da liberdade propriamente dita? Foi o que aconteceu. Neste ponto, não quero entrar no mérito se a charge deveria ter sido ou não publicada, mas foi a liberdade de expressão da imprensa francesa que encadeou os atentados, a privação da liberdade das vítimas, várias mortes, inclusive.

A liberdade é o direito de primeira geração ou dimensão conquistada pela civilização atual, luta histórica. Esta não pode ser perdida em hipótese alguma. A perda da liberdade de expressão, que decorre da primeira, facilita a perda da própria liberdade.
Acredito, portanto, que é necessário a manutenção da liberdade de expressão, como garantia da própria liberdade.

A liberdade de imprensa é ruim? Merece ter limites? Aqui caberia longa discussão. Prefiro me ater que esta é boa e não deve ter limites, salvo aqueles do razoável.

Leonardo Boff, em seu artigo, diz que no mundo hodierno já existe certa censura na mídia que impede, por exemplo, a calúnia, ou seja, a imputação da prática de um crime a alguém.

Correto entendimento do autor. Já existe certa linha que possibilita saber o que é ou não razoável, apesar de que não concorde com a ideia central do texto por este escrito.

Na França ocorreram, conforme noticiam as mídias, manifestações que podem ser consideradas a maior que já existiu. Ecoou no mundo e todos os adeptos à manutenção das liberdades se expressaram com a frase: Je suis Charlie, que significa eu sou Charlie, nome da revista francesa. Foi, também, uma forma de compartilhar do sofrimento que ainda paira no momento, compaixão.

Leonardo Boff diz que ele não é Charlie. Não consegui entender o porquê.

Stéphane Charbonnier, o Charb, que estava no comando da mídia francesa, alvo do ataque, disse que “É preciso que o Islã esteja tão banalizado quanto o catolicismo”.

Talvez esta frase mostre certa intolerância. Mas tudo deve ser observado com o devido olhar. Uma coisa é uma fala, uma afirmação, uma máxima, outra coisa é a prática da intolerância.


Na realidade, penso que a frase não tem tanta gravidade como alguns querem pintar. A palavra ‘banalizado’ sugere interpretação pejorativa, que a religião precisaria ser colocada à margem, esquecida. A palavra foi mal colocada mesmo.

Mas vamos à justa interpretação, talvez aquela que ele próprio gostaria que fosse feita. Quiçá ele deveria ter trocado ‘banalizado’ pela palavra ‘criticado’, com a devida concordância. Aí ficaria “É preciso que o Islã seja tão criticado quanto o catolicismo”.

Crítica! Não é o que os artistas de cinema, teatro, musicistas, comediantes, fazem? Se a charge que foi publicada, e que gerou os ataques terroristas, não poderia ser publicada, então o que poderia?

A crítica ao catolicismo, como se vê comumente, talvez tenha sido o instrumento que mais proporcionou que a Igreja Católica se reinventasse. E, graças à mídia, escândalos foram descobertos, por exemplo. Coisa que ninguém queria falar, coisa que feria os adeptos fervorosos. Mas foi colocado o dedo na ferida.

Já pensou se a mídia deixasse de falar em corrupção só por conta que existe uma religião adepta a ela?

Brincadeiras a parte, mas que colaboram a crítica que se pretende, a liberdade de expressão é necessária que seja mantida. Aquele que abusa da liberdade de expressão, via de regra, é colocado pela própria sociedade em seu devido lugar. Se eu faço um péssimo jornalismo, contanto inverdades, fazendo críticas sem bom senso, de mau gosto, certamente meu trabalho não vai ser comprado e revendido.

Afinal, o que justifica 17 assassinatos?

E, para concluir, nesta arte da crítica, a capa da última edição da Veja foi fantástica. Sugere que não percamos o medo das nossas atitudes, de nos expressarmos.

Às armas, cidadãos!

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